Sete em cada dez familiares não têm notícias de parente encarcerado na pandemia

No período da pandemia, 69,6% das famílias apontam estar sem qualquer tipo de informação ou contato com parente encarcerado. Entre os familiares que têm conseguido manter algum tipo de contato com o preso, o acesso à informação tem se dado principalmente por meio de cartas ou pelos advogados e assistentes sociais das unidades prisionais. Esses são os resultados de estudo sobre os impactos da Covid-19 em familiares de presos do estado de São Paulo realizado pelo Núcleo de Estudos da Burocracia (NEB), da Fundação Getulio Vargas, em parceria com a Associação de Familiares e Amigos de Presos e Presas (AMPARAR).

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Os pesquisadores realizaram um survey online com 1.283 familiares de pessoas que estão presas em unidades prisionais do estado de São Paulo, entre os dias 25 de junho e 4 de julho de 2020. Das 1.283 respondentes, 99% são mulheres. “É um dado que reflete a sobrecarga das mulheres, tanto mães quanto esposas, na atenção e no suporte ao familiar preso”, afirma Mariana Haddad, pesquisadora do NEB e do Núcleo de Pesquisa Escola da Metrópole. Com relação ao perfil da pessoa presa, cujo familiar respondeu à pesquisa, 97% foram apresentados como homens e 3% como mulheres. Deste total, 20,5% são presos provisórios e 89,4% encontram-se estão em regime fechado.

O acesso à informação por meio dos advogados particulares foi um dos principais motivos para os familiares afirmarem que o advogado tem ajudado a proteger o preso no contexto atual. Em resposta à pergunta ‘Você acredita que esse advogado tem ajudado a proteger seu familiar nesse momento de pandemia?’, 41,4% dos que acreditam que sim o justificam pelo fato de o advogado ser o único meio de notícias para ambos os lados (presos e familiares).

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Preocupação com a saúde

Para 54,1% dos familiares respondentes, as condições de saúde do preso são a principal preocupação, sendo que 42% das famílias têm medo de contaminação do familiar preso com o coronavírus. Parte das famílias apresenta preocupação com os familiares asmáticos e se teriam acesso a bombinhas. Outros apontam apreensão com questões de saúde mental dos presos, especialmente dada a restrição de visitas. Há ainda depoimentos sobre o receio de que os agentes prisionais possam ser vetor de transmissão e levar o vírus para dentro das unidades.

Familiares entrevistados também apontam preocupação em relação ao familiar preso estar passando fome, visto que os presos não estão recebendo os chamando “jumbos”. Do mesmo modo, a questão da higiene dos presos também apareceu como uma preocupação no momento atual. Sem as visitas e, novamente, sem poder enviar materiais (“jumbos”), os familiares ficam com receio dos presos estarem sem os itens básicos de higiene, os quais seriam imprescindíveis na prevenção da Covid-19.

“Somado ao fornecimento limitado de refeições em algumas unidades prisionais, os dados apontam que as famílias estão com dificuldades de enviar o “jumbo”, tanto por conta da proibição de visitas quanto pelos problemas financeiros agravados pela pandemia do coronavírus. O cenário reforça a necessidade de inclusão de uma refeição noturna no cardápio das unidades prisionais como garantia de direitos básicos da pessoa presa e de condições adequadas de saúde em um contexto de pandemia”, avalia Gabriela Lotta, professora da EAESP FGV, coordenadora do NEB e pesquisadora do Centro de Estudos da Metrópole.

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Acesso à Justiça e falta de suporte

A falta de suporte para lidar com a situação da pandemia também tem sido uma reclamação dos familiares de presos. Cerca de 96% das famílias alegaram não ter recebido qualquer suporte da Secretaria da Administração Penitenciária (SAP) neste momento. Ao avaliarem os diretores das unidades prisionais, 41% das famílias avaliam a atuação como ruim ou péssima no enfrentamento da situação, contra apenas 7% avaliando a atuação como boa ou ótima.

Três em cada quatro familiares entrevistados afirmam não acreditar que o defensor público ou o advogado particular possa proteger o familiar preso no contexto atual. E 30,8% apontaram a falta de atenção com a família, que fica muitas vezes sem retorno ou notícias. Quase metade (48%) dos familiares responderam que o preso tem advogado particular, enquanto 39% responderam que a defesa é realizada pela Defensoria Pública e 12% afirmaram não ter qualquer tipo de advogado ou defesa.

Dos respondentes que afirmam não acreditar que o defensor público tem ajudado a proteger o preso, 38% não conhecem o defensor público nem tiveram contato com ele. Com relação aos advogados, 46,3% dos familiares apontam que o fato de o advogado não ajudar neste momento não é culpa ou problema dele, já que há limitações externas neste momento.

“O que observamos é que, no sistema carcerário, a falta de informação, a dificuldade do efetivo acesso à Justiça, o atendimento precário à saúde e até a insegurança alimentar são questões que têm se tornado mais críticas com a pandemia”, afirma Giordano Magri, pesquisador do NEB.

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Impacto socioeconômico da pandemia

Oito em cada dez familiares afirmaram que sua renda diminuiu nesse período, sendo que 26,5% ficaram sem rendimento. Além disso, 34% das famílias estão com dificuldades para se alimentar. A renda média das famílias respondentes também caiu e atingiu o valor aproximado de R$1.097,32, enquanto a renda per capita chegou a R$371,13, abaixo da linha da pobreza elaborada pelo Banco Mundial e adotada pelo IBGE. Para 44% das famílias, o Auxílio Emergencial é o principal meio de sobrevivência nesse momento. Todavia, 22,4% delas ainda não receberam o auxílio.

“O impacto socioeconômico causado pela pandemia do coronavírus atingiu diretamente as famílias de pessoas presas e, consequentemente, seus parentes privados de liberdade. Muitas dessas famílias dizem depender do Auxílio Emergencial para sobreviver nesse momento, mas uma parcela considerável delas ainda não teve acesso a esse suporte do governo federal”, afirma Claudio Aliberti, pesquisador do NEB.

De Bori

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